A Psicopedagogia, a escola e a alfabetização - Por Denise Tenório
A escola tradicional está sendo transformada ao longo do tempo. E anelada a tantas reflexões que trouxeram novas concepções a respeito da educação, a Psicopedagogia contribui também neste processo, transformando as velhas cartilhas, tão distante da realidade do educando, em um material construído pelo professor conforme o conteúdo e cotidiano do educando, refletindo sobre a língua escrita e as mediações possíveis entre sujeito e objeto.
A Psicopedagogia preocupada com questões referentes ao motivo pelo qual o educando não aprende, como aprende, busca então responder a estas questões, através da analise dos sintomas apresentados pelo educando, tais como lentidão, dispersão, dificuldades de elaboração, compreensão e projeção da aprendizagem. Tais sintomas devem ser estudados à luz dos aspectos físico, emocional, social e cultural do educando, levando-se em conta suas relações tanto com o ambiente familiar, como o escolar e o social. Assim a psicanálise, a psicologia social e epistemologia genética, a Psicopedagogia objetiva o reconhecimento das capacidades do educando visando retirar o obstáculo que impede de aprender.
Dentro da escola, a alfabetização tem sido motivo de grande preocupação entre os profissionais, já que como nos ensina Freire(1987) esta deve cuidar para libertar o homem.
Contudo, a Psicopedagogia preocupada com todo o processo que leva o educando a aprender, percebendo que o ensino tradicional voltado para a repetição, a memorização, cópias reiteradas de modelos de mecanização apenas possibilitam ao educando a apropriar-se do nada, demonstra Ferreiro(2003), estas crianças acabam por serem meras reprodutoras de signos. Desta forma, a Psicopedagogia analisa a forma pela qual o educando está se apropriando da escrita, compreendendo também seus erros e caminhos por ela percorridos para ali chegar.
Por esta razão o diagnóstico psicopedagógico leva em consideração a possibilidade de o paciente penetrar no significado daquilo que escreve ou lê e, para isto, usará situações como jogos, desenhos, pinturas, palavras cruzadas, dramatizações, divertimentos com revistinhas e livros de história. Assim, observa o modo com que o educando se aproxima ou evita essas atividades, sua postura, as dissociações de campo, o abandono da tarefa e a temática do material escolhido para ler ou escrever.
Desta forma, através da observação é estabelecida uma correlação entre a qualidade do que o educando pode produzir como texto ou obter como leitura e a exigência a que está submetido na escola.
Neste aspecto, Weiss(2003) chama atenção para o desrespeito quanto ao ritmo de construção da criança no ler e escrever esclarecendo que tal fato cria uma dificuldade que se avoluma como bola de neve, podendo chegar a impedir o processo de verdadeira alfabetização, já que cria bloqueios, dando-nos assim o seguinte caso como exemplo: Relembro o caso de Pedro(6 anos, C.A.), que se recusava a desenvolver qualquer atividade que envolvesse a língua escrita, e disse-me: “EU não quero ler. EU não quero ficar grande. Minha mãe conta do livrinho para mim todo dia”(WEISS,2003,p.96)
Para compreender o desenvolvimento da leitura e da escrita, evitando o desrespeito à forma pela qual cada educando se apropria da escrita, Ferreiro (1999) concluiu que há uma série de modos de representação da linguagem. Sua psicogênese da língua escrita distingue cinco níveis: pré-silábico nível I, pré-silábico nível II, silábico, silábico-alfabético e alfabético. Cada um deles apresenta uma fase de evolução do educando, justificando a proposta pela razão de que a escrita produzida antes do ensino sistemático traz os mais claros indicadores das explorações infantis para compreender a natureza do processo de aprendizagem.
Quando uma criança escreve tal como acredita que poderia escrever certo conjunto de palavras, estão nos oferecendo um valiosíssimo documento que necessita ser interpretado para poder ser avaliado...Aprender a lê-las, isto é, a interpretá-las é um longo aprendizado que requer uma atitude teórica definida. (FERREIRO,1985,p.16).
Por este motivo torna-se necessário ao avaliar, observar o vínculo do educando com o que escreve, o processo de escrever, o produto final em todos os seus aspectos, o que quis escrever, conceituando, e percebendo o motivo dos enganos (erros). Ferreiro e Teberosky(1999) na sua obra demonstra que o educador precisa perceber que a criança primeiro aprende a escrever para só depois dominar a ortografia. As incorreções que comete, portanto, não significam que não tenham aprendido, sendo necessário compreender as causas do erro para levá-la a superá-lo com base em um trabalho de conhecimento da forma ortográfica correta.
Outras questões também são levantadas por estas autoras, que ressaltam a necessidade de observar no educando: em relação com as pessoas ( se interage com outras pessoas; se sabe quem é o professor e como demonstra isso; se presta atenção quando o outro fala; a sua relação consigo mesmo); a sua relação em relação ao espaço ( sabe qual a sua sala, como se locomove nos espaços da escola, se sabe qual é a sala onde guarda seus pertences); relação com o tempo( se realiza as tarefas no tempo planejado, se é muito rápido ou muito lento, se reconhece a rotina dos horários, sabe quando é a hora da merenda, da roda, da conversa); relação com objetos ( sabe o que é seu, o que é do outro, como demonstra isto, cuida dos seus pertences, dos objetos da escola, como manuseia os objetos); relação com as atividades( demonstra compreender as tarefas, como o faz, precisa de ajuda, como brinca, participa ou prefere ficar sozinho? Quais as atividades que prefere ou evita?).
É necessário olhar o educando no todo, não negligenciando o seu contexto histórico-social-familiar. Portanto, a Psicopedagogia contribui com este novo olhar para onde a escuta e a intervenção estão voltadas para todo o movimento subjetivo do educando frente ao conhecimento, no decorrer da construção deste sujeito no ato de aprender, tendo como finalidade a autoria do pensamento, que é a descoberta da originalidade e da diferença, da marca e, a partir daí, abrir espaço para a criatividade. Desta forma, a Psicopedagogia chega transformando também a escola, o seu espaço, tornando-a mais acolhedora, criativa, indo além dos métodos.
Referências bibliográficas:
FREIRE, Paulo.Pedagogia do oprimido. São Paulo: Paz e Terra, 1987.
FERREIRO, Emília. Reflexões sobre alfabetização. São Paulo: Cortez, 1985.
_______________.Com todas as letras. São Paulo: Cortez, 2003.
FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1999.
WEISS, Maria Lúcia Lemme. Psicopedagogia clínica, uma visão diagnóstica dos problemas de aprendizagem escolar. 10 ed. Rio de Janeiro: DP&A, 2003.